Por Adriana Drapala
Sempre foi muito difícil tornar qualquer objeto visível parecer preto, já que de alguma forma ele irá refletir luz.
A história da arte está repleta de ricas experiências documentadas a respeito de como eram criadas as cores.
Os artistas além de pintores eram verdadeiros alquimistas, e para chegar ao pigmento desejado pulverizavam e moíam minerais e vegetais.
Esse material em sua forma bruta era encontrado em lojas medicinais, isso mesmo que você leu, o mesmo lugar onde os médicos encontravam a matéria prima para desenvolver medicamentos da época, era o mesmo onde o artista encontrava o que precisava para produzir suas tintas, telas etc.
O pintor Cennino Cennini em seu manual para artistas do século XV ensinava a criar o pigmento próximo ao preto com variação de tons queimando tentáculos das trepadeiras, ou cascas de amêndoas, caroços de pêssego, cereja ou damasco, e o carvão em pó resultante era misturado com água, goma arábica, ou com um ovo para fazer a tinta da época.
Leia Cennino Cennini descrevendo como era feito o pigmento usando também a lâmpada negra durante a Renascença: “… pegue uma lâmpada cheia de óleo de linhaça, encha a lâmpada com o óleo e acenda a lâmpada. Em seguida, coloque-a, sob uma panela bem limpa e certifique-se que a chama da lâmpada é dois ou três dedos da parte inferior da panela.
A fumaça que sai da chama vai bater no fundo da panela e recolher, tornando-se grossa. Aguarde um pouco. Pegue a panela e escova este pigmento (isto é, esta fumaça) em papel ou em uma panela com alguma coisa. E não é necessário misturar ou moer porque é um pigmento muito fino.
Encha novamente a lâmpada com o óleo e coloque-a embaixo da panela. assim várias vezes e, assim, fazer o máximo que for necessário “.
É possível criar um pigmento preto 100%, além do buraco negro, considerado cientificamente o único preto autêntico pela absorção total de luz?
Um buraco negro é uma região do espaço-tempo onde a gravidade impede que qualquer coisa, incluindo a luz, escape.
Quando as cores são formadas por luzes conseguimos uma aproximação do preto retirando a luz sobre a intersecção dos espectros correspondentes ao vermelho, verde e azul (RBG).
Porém, se estamos trabalhando com pigmentos, a aproximação é encontrada se proporções apropriadas de três primários são misturadas, o resultado reflete tão pouca luz a ponto de chamarmos de “preto”.
O preto só é preto se a maior parte da luz recebida é absorvida igualmente no material, no espectro visível, o preto é a absorção de todas as cores.
O Glamour do Preto do Século XIV ao XVI
Enfim, o preto atinge seu auge no século XIV através de corantes negros de alta qualidade permitindo roupas exuberantes de um negro rico e profundo representando magistrados e funcionários do governo, banqueiros e mercadores do norte da Itália.
No final do século XVI já era a cor mais usada por quase todos os monarcas da Europa e seus tribunais.
Com a chegada da revolução industrial veio os corantes negros sintéticos baratos o preto pela primeira vez era acessível para a população
O preto estava ao alcance de todos sem a necessidade da sabedoria, esforço físico, trabalho árduo, e tempo hábil para produzi-lo, e todo aquele conhecimento químico dos grandes mestres caía em desuso.
Artistas como Delacrouix e Thompson torciam o nariz e não eram adeptos, defendiam com afinco aos fundamentos essenciais do ofício da pintura, confesso que eu também teria o mesmo comportamento, tudo bem que com todas essas mudanças, o artista que até então precisava de espaços enormes em seus ateliês para pintar e estocar matéria bruta e produzir suas tintas, também era aprisionado no interior dos estúdios, e perceber a curto prazo a morte horrorosa de uma de suas competências que valorizava o ofício, não deve ter sido nada fácil para alguns desses grandes mestres, não é mesmo?
De repente era possível levar a tela para fora do estúdio, sair pintando o pôr do sol, viajar mundo afora com a aquarela debaixo do braço pintando o sete por aí, a pintura tornava-se portátil.
Mas enfim, o preto 100% existe?
Os séculos se passaram e em 2014 a empresa britânica chamada Surrey NanoSystems que atendia a indústria aeroespacial anunciava uma substância feita de nanotubos de carbono alinhados verticalmente e a chamava de “VANTABLACK” capaz de absorver 99,965% de radiação, ou seja, ao invés de refletir a luz fazia a captura dela pelos tubos, e a sensação ótica é de estar olhando para um buraco negro, sim aquele mesmo do espaço, aquele mesmo que citamos no início desta matéria.
No início foi para atender necessidades nos setores de defesa, aeroespacial até telescópios.
Em 2019 foi aplicada no segmento automotivo, a BMW X6 recebeu a pintura mais preta do mundo. – A Vantablack refletindo apenas 1% da luz, dando a possibilidade de ainda ver alguma silhueta do carro, com a opção ainda mais escura que torna o veículo 2D ao olho humano.
A intenção da indústria é que o mais autêntico dos pretos, seja logo acessível a todos, e a resposta da pergunta feita é bem simples, o preto é sim uma cor, e uma das mais complexas de se criar.
Fontes das Referências para esta matéria:
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